9 de abril de 2013

Premonições com gosto de saudades

Fazia aquele trajeto familiar. Já era tão familiar que sequer precisava acompanha-lo pela janela. Estava feliz. Acordara cedo, cedo o suficiente para lanchar e ler Proust enquanto aguardava o início da aula. E estava conseguindo voltar para casa, relaxando, sentada no ônibus. 

Deixou o vento entrar por sua janela enquanto lia um texto de literatura inglesa. Estava na terceira página de umas quinze, ouvindo Leonard Cohen, quando levantou a cabeça. A paisagem a chamava. E não era das mais bonitas. Não passava pela praia, ou pela Lagoa ou pelo aconchegante bairro do Grajaú. Estava em um elevado, no meio do trajeto que a levava da UFRJ até a leopoldina. Entretanto pegou-se observando a vista.

Uma certa melancolia tomou conta de si. E sentiu saudades. Saudades estranhas, ela achava. Saudades do Rio. Saudades daquele trajeto. Saudades dos 485 vazios e até um pouco dos cheios - pero no mucho. Saudades da Letras, dos corredores, do Bloco F, do Bloco H, do bandejão. Da biblioteca. Da xérox. Viu beleza no trecho simples pelo qual passava. Viu a cara do Rio. Viu pela Feira de São Cristovão. Viu as casinhas no morro que compunham o que é chamado de favela. Achou aquilo bonito. Viu uma beleza que jamais tinha visto antes. Como aquilo se encaixava ali e como sentia falta de prestar atenção nelas, sendo que jamais havia prestado - a não ser quando viu a Rocinha pela primeira vez e se sentiu quase invadida, engolida, quase como se abraçasse São Conrado, que ela também sentia saudades. Não entendia o porquê. 

Até que sorriu. Um sorriso triste. Premonições? Essas premonições estavam lhe perseguindo há algumas semanas e ela já estava deixando se levar por elas. Tudo o que podia fazer era sonhar e esperar. Mas eram tantos sonhos e tantas esperanças que não sabia qual estava na frente da sua enorme lista.

Em Almost Famous Zooey Deschannel mandou o protagonista "ouvir Tommy com uma vela acesa e você verá seu futuro inteiro". Não sei se ali William já viu o que queria ser. Mas ao som de Leonard Cohen, durante uma leitura de Literatura Inglesa, ao som de The Future, ela sentiu saudades do presente. E ela gostou.